Instruções Iniciáticas

 

 

S. Paulo, Rembrandt van Rijn (1606-1669)

 

Paulo, o Iniciado

 

António de Macedo

 

Esta mística inserção num veio comum tradicional tem levado certos estudiosos a pensar que os Mistérios cristãos se inspiraram formalmente nos mistérios do mundo antigo:

 

A acrescentar às tradições do AT e respectiva liturgia sinagogal, as tradições dos cultos mistéricos helenísticos também foram absorvidas e reinterpretadas segundo fórmulas cristãs. Assim, dentre as tradições tomadas das religiões mistéricas contam-se por exemplo: a disciplina arcana com a distinção entre os verdadeiros mystai (os iniciados nos segredos da fé cristã) a quem era permitido participar no serviço esotérico (isto é, a Eucaristia), e os catecúmenos; a introdução de hinos cantados cuja forma dependia do estilo melódico dos hinos mistéricos (além dos Salmos judeus); a manutenção do antigo gesto de mãos erguidas durante a epiclese sacramental que invoca a infusão do Espírito Santo no pão e no vinho no momento da consagração; e muitos outros[1].

 

Chegado a este patamar peço licença para fazer uma pausa. Talvez não seja má ideia, depois de tantas vezes ter falado em «mistério» e «mistérios», determo-nos um pouco para tentar descobrir o que se esconde por trás de tais palavras, e digo bem, palavras, e não apenas uma palavra só usada umas vezes no plural, outras no singular.

Mais do que um ideólogo do saudosismo e um filósofo da estética e da simbólica, Afonso Botelho (1919-1996) questiona-se com fequência, nos seus escritos, acerca das origens e dos arquétipos, e deixa-nos uma primeira observação, límpida e motivadora, sobre a distinção singular-plural a que acabo de me referir:

 

… O essencial do mistério cristão, para além da separação intransponível da natureza dos dois mundos, está na oferta cativante de uma via para a transpor. […] Inversa é a configuração do mistério ou dos mistérios gregos. Verdadeiramente, só existem mistérios e não mistério na Grécia, só existem actos de um ritual secreto praticados pelos mystai. O mistério como caminho entre dois mundos naturalmente incomunicáveis só depois da Encarnação do Homem-Deus, só depois de Cristo, se completa[2].

 

Recuando no tempo, e incorrendo embora no pecado de aqui repetir enxutamente o que vem em diversos livros e dicionários, começarei por esclarecer ao leitor menos lidado nestas porfias que a palavra mistério tem a sua origem primeira na raiz mu-, ou my- (em grego mu), donde derivam dois verbos: mueô , que significa «iniciar», «sagrar», «instruir», e muô, que significa «fechar a boca ou os olhos», «guardar silêncio». Da mesma raiz deriva o latim mutus, «mudo», e o grego muthos ou mythos, o que nos ensina que o silêncio se associa ao mito, tal como silenciosa deverá ser a Iniciação menor, muêsis, que se completa pela Iniciação maior, teletê, sendo que esta última deriva do verbo teleô, que significa simultaneamente «concluir» e «iniciar», ou seja, «iniciar nos mais altos Mistérios», ou nos Mistérios de plenitude ou de perfeição. O mais alto grau de Iniciação também se chamava epopteia, já notaremos adiante porquê.

Avançando um pouco mais no mesmo terreno, observamos assim que os mistérios (ta mystêria) são por conseguinte a teoria de ritos (ta drômena, «actos») que conduzem iniciaticamente do silêncio à perfeição, e isto tanto no Egipto antigo como na Pérsia ou na Grécia. O iniciado tem acesso, por secretos cultos, a regiões — ou melhor: a níveis de ser — inexprimíveis ou inefáveis, o que em grego se dizia arrhêta[3], que por sua própria natureza indizível se tornam naturalmente incomunicáveis, não por qualquer imposição ou obrigação externa de «manter segredo»[4], mas porque o iniciado ao atingir o cerne do sagrado atinge o «inefável», e faltam-lhe meios de expressão adequados para comunicar ao mundo profano o que, na linguagem e segundo a razão desse mundo, seria incompreensível, e sobretudo porque a Iniciação não é uma cerimónia externa, mas, nunca será de mais repeti-lo, uma experiência interna[5].

Em todos os mistérios da Antiguidade (Isíacos, Mitríacos, Órficos, Eleusinos, etc.) vigorava a lei dos três graus, que remonta aos tempos miticamente Atlantes e do seu símbolo sacerdotal, o enigmático Tabernáculo no Deserto, configurado no Templo de Salomão pela confraria de «construtores de Templos» regulada por Hiram[6], símbolo que se prolonga pelos Collegia Fabrorum romanos e medievais e teve o seu apogeu na Ordem de Construtores e Arquitectos (Ordem Maçónica), que foi a escola dos construtores de templos góticos contemporâneos dos Templários. Esses três graus eram, para os mistérios antigos: postulante (‘o exô, «o de fora»), neófito ou misto (mystês, plural mystai), e epopta (epoptês, plural epoptai). Ou seja, mediante o rito que lhe proporciona o arrebatamento ao mundo sensível (ekstasis), o postulante torna-se um neófito ou antes um misto, ou aquele que ainda tem os olhos fechados, para se converter finalmente em epopta — da raiz ops, «olho» —, ou aquele que vê as coisas tais quais são[7]. Do mesmo modo se distinguem os graus dos Iniciadores: o dos mystai será o mystagogos, para a Iniciação menor (muêsis), enquanto o dos epoptai é o telestês, para a Iniciação maior (teletê, ou epopteia como dissemos acima).

Desde relativamente cedo se começou a observar nas primitivas comunidades cristãs uma graduação igualmente tripartida, tanto nas fases eclesiais atinentes ao culto externo como na fase interna, mais elevada e menos visível. Na fase externa encontramos as seguintes gradações, se assim se podem chamar: o catecúmeno (katêchoumenos), o baptizado ou neófito (neophytos — 1 Tim 3, 6), e o presbítero (presbyteros) ou bispo (episkopos, equipolente a epoptês). Os presbíteros podiam transmitir dons espirituais (charismata) por imposição das mãos (meta epitheseôs tôn cheirôn), conforme lemos no epistolário do NT (1 Tim 4, 14; 2 Tim 1, 6). O catecúmeno era o equivalente a postulante, recebia instrução religiosa durante três anos a fim de se preparar para o baptismo e podia assistir a certos ritos do culto. Por sua vez, o presbítero ou bispo (parece que inicialmente ambas as palavras designavam a mesma função) contava com um grau intermédio, o diácono, para o auxiliar sacerdotalmente no seu ministério —, se bem que a palavra diakonos, então, assumisse por vezes o sentido mais amplo de «servidor» (lat. minister) que se poderia aplicar aos sacerdotes, ou ao ministério sagrado, duma forma geral.

Esta, portanto, a fase formal — externa. Por sua vez os Mistérios cristãos constituem a fase oculta — mais elevada e interna. Dela trataremos, um pouco mais detalhadamente, na segunda e na terceira partes deste livro.

Que sempre existiu um esoterismo cristão é indiscutível, embora a Igreja católica se esforce por desmenti-lo, sobrevalorizando o lado exotérico da catequese e da liturgia[8]. Não há que negar a legitimidade do formalismo exotérico da religião cristã, pelo contrário: se bem que as bases iniciais sejam, tudo no-lo atesta, esotéricas, a formulação exotérica da doutrina torna-se indispensável para que a chama da respectiva linhagem tradicional não se extinga no mundo — paradoxo que, sendo impossível de se tornear, acarreta consigo um pesado ónus, pois essa formulação exotérica acaba por se constituir, praticamente, na sua única «verdade oficial».

Certas confusões são perniciosas e devemos a todo o custo areá-las e esclarecê-las: sem dúvida que falar-se em «Cristianismo esotérico», não sendo, em rigor, um erro, pode induzir em erro[9], porque o Cristianismo em si não é exclusivamente esotérico, é uma religião dada por Cristo para a salvação de todos e comunicável a todos. O que não significa, porém, que não exista um «esoterismo cristão», acessível apenas aos que queiram aprofundar os mistérios do Reino de Deus, como refere Orígenes no seu livro Contra Celsum[10]. O próprio Jesus fazia a distinção entre o que podia transmitir às multidões e o que reservava aos discípulos, a quem dizia: «A vós deu-se-vos a conhecer os mistérios do Reino dos Céus, mas a eles não lhes foi dado» (Mt 13, 11). No passo paralelo do Evangelho de Marcos, Jesus define claramente quem são aqueles a quem tal não é dado: «Aos de fora [gr. tois exô] tudo se lhes dá em parábolas, a fim de que olhando, olhem e não vejam, e ouvindo, oiçam e não entendam, não suceda que se convertam e se libertem» (Mc 4, 11-12). «Os de fora» (‘oi exô), são os profanos ou ainda só postulantes, isto é, os que ficam «fora do Templo» e a quem, portanto, apenas se lhes podem ministrar instruções exotéricas. Paulo dizia o mesmo por outras palavras: «E eu, irmãos, não pude falar-vos como a espirituais, mas como a carnais, como a meninos em Cristo. Leite vos dei a beber, não comida sólida, pois ainda não éreis capazes» (1 Cor 3, 1-2).

Alguns mais radicais, como René Guénon, vão mais longe e pensam que as verdadeiras origens do Cristianismo — e sobre as quais o NT, na forma como chegou até nós, é esclarecedor sem ser claro — teriam sido de facto esotéricas (mas não na linha de Annie Besant, cuidado!), e que a divulgação generalizada constituiria um fenómeno posterior:

 

Será provavelmente impossível determinar o momento preciso em que o Cristianismo se transformou numa religião no sentido próprio do termo bem como numa forma tradicional destinada a toda a gente, sem distinção. Seja porém como for tratava-se dum facto consumado na época de Constantino e do Concílio de Niceia, de tal sorte que este não fez mais do que «sancioná-lo», por assim dizer, inaugurando a era das formulações «dogmáticas» destinadas a constituir uma apresentação puramente exotérica da doutrina.

[…] É pois evidente que a natureza do Cristianismo original, sendo essencialmente esotérica e iniciática, devia permanecer completamente ignorada por parte daqueles que passaram a ser admitidos no Cristianismo agora exotérico; por conseguinte, tudo quanto pudesse evidenciar ou sequer sugerir o que tinha sido realmente o Cristianismo nas suas origens deveria ser recoberto, aos olhos daqueles, por um véu impenetrável[11].

 

Sobre a existência de Mistérios cristãos testificam-nos alguns autores antigos, de forma mais ou menos translúcida dentro dos limites em que era possível falar-se de tais matérias. Costumam ser muito invocados, a este respeito, dois teólogos de inspiração platónica da Escola de Alexandria, dos séculos ii e iii, preocupados com os mistérios alegóricos contidos na essência do Cristianismo e que não excluem uma interpretação esotérica das Sagradas Escrituras. Refiro-me a Clemente de Alexandria (aprox. 150-216) e ao seu discípulo Orígenes (185-254).

Uma das obras mais conhecidas do primeiro, Stromateis («Miscelâneas»), é particularmente importante pelo testemunho que nos oferece da existência de Mistérios associados ao Cristianismo primitivo, e a um ensinamento secreto; por exemplo:

 

O Senhor não nos impediu de fazer o bem por causa das leis do sábado; Ele concordou que os que são capazes de compreender[12] partilhassem dos mistérios de Deus e da sua santa luz[13]. Além disso não revelou ao homem vulgar o que não era para ele; revelou-o, sim, a alguns poucos, a quem sabia que tal revelação lhes seria apropriada, e capazes de aceitar os mistérios e de se coadunar com eles. As coisas secretas, tal como o próprio Deus, não se devem confiar por escrito, mas sim exprimirem-se pelo Logos [ou: por palavra]. E se alguém nos contrapõe citando a Escritura: «Nada há encoberto que se não descubra, nem nada escondido que se não dê a conhecer» (Mt 10, 26)[14], responder-lhe-emos que nesta frase [Jesus] predisse que os segredos ocultos serão revelados aos que escutam em segredo, e que tudo o que é velado, como a verdade, será descoberto aos que são capazes de receber as tradições sob um véu, e o que é incompreensível à maioria será claro para a minoria.

[…] Os mistérios são transmitidos misteriosamente, de boca a ouvido, ou melhor, não nas vozes do que fala e do que escuta, mas nas suas mentes. Deus concedeu à Igreja que uns sejam «apóstolos, outros profetas, outros evangelistas, outros pastores e instrutores, para aperfeiçoamento dos santos na obra do seu ministério, e para edificação do corpo de Cristo» (Ef 4, 11-12).

Estou bem consciente da pobreza desta minha compilação de notas comparada com a graça do Espírito que me considerou digno de o escutar. Mas ao menos será como que uma imagem, que lembrará o arquétipo original àquele que tiver sido tocado pelo tirso[15]. «Dá ao sábio, e tornar-se-á mais sábio ainda», diz a Escritura (Prov 9, 9), e «ao que tem, dar-se-lhe-á e terá em abundância» (Mt 13, 12). Há aqui uma promessa, não de dar uma plena interpretação dos segredos — longe disso —, mas de oferecer um vislumbre para quando nos esquecemos, ou para evitar que isso aconteça[16].

 

Vejamos um outro elucidativo passo do mesmo livro de Clemente Alexandrino:

 

Uma vez que a nossa tradição não é recebida em comum nem aberta a todos, e muito menos quando nos damos conta da magnificência do Logos, segue-se que temos de manter secreta «a sabedoria de Deus em mistério, a oculta»[17], ensinada pelo Filho de Deus. O próprio profeta Isaías precisou de ter a língua purificada pelo fogo para poder revelar a sua visão[18]. Nós também precisamos de ser purificados tanto de ouvido como de língua, se nos propomos partilhar da verdade. Só de pensá-lo, tolhe-se-me a mão para o escrever, e, observando as palavras da Escritura, cuidarei de não lançar as pérolas aos porcos, não aconteça que as pisem aos pés e, acometendo-nos, nos despedacem[19]. É difícil apresentar argumentos puros e lúcidos, a respeito da verdadeira luz[20], a pessoas que são como cevados na sua falta de educação. Quase nada há que pareça mais ridículo aos homens vulgares do que estes discursos, nem mais maravilhoso e divinamente inspirado para os que sejam de nobre natureza. «Mas o homem vivente não capta as coisas do Espírito de Deus, pois são loucura para ele»[21]; os sapientes não anunciam em público o que discutem em concílio. «O que vos digo às escuras, dizei-o à luz do dia, e o que escutais ao ouvido, proclamai-o de cima dos terraços», diz o Senhor (Mt 10, 27). Ele quer dizer que recebamos as tradições secretas do conhecimento revelado, interpretadas com a máxima elevação, e, uma vez que as ouvimos murmuradas aos nossos ouvidos, que as transmitamos a quem delas seja digno, e não que as espalhemos sem reserva a qualquer um, quando Ele, para estes, o fez em parábolas[22].

 

Quanto a Orígenes, um dos maiores eruditos da Patrística grega e profundo conhecedor dos mistérios pagãos, é autor dalgumas obras monumentais — e essenciais — de que se destacam os Hexapla, por exemplo, primeiro intento de se estabelecer um texto crítico do AT a partir de seis versões correntes gregas e hebraicas, que cotejou em seis colunas paralelas e cuja organização lhe consumiu praticamente a vida inteira, além do denso tratado Peri archôn («Acerca dos princípios»), que a Igeja considera discutível e que o ascético Rufino de Aquileia (345-410) traduziu com o título De principiis adulterando-o e eliminando intencionalmente as passagens e as fórmulas mais «suspeitas». Entretanto, e para o que ora nos importa, basta que nos abeiremos do seu elucidativo tratado Contra Celsum, escrito provavelmente no ano 248 em refutação do livro Discurso verídico, ataque demolidor que o filósofo Celso, igualmente neoplatónico como Orígenes mas ferozmente anticristão, desfere contra o Cristianismo. Naquele, Orígenes revela algumas coisas:

 

E nada digo por ora do estudo cuidadoso de tudo quanto está escrito no Evangelho. Cada ponto contém muitas razões difíceis de entender, não só para o vulgo, mas incluso para algumas pessoas inteligentes. Tal, a densa exposição das parábolas que Jesus fazia aos de fora[23], guardando a explicação delas para os que tinham ultrapassado a audição exotérica e se aproximavam privadamente d’Ele, em casa. Celso admirar-se-ia se conseguisse compreender o motivo que há para se chamar a uns «de fora», e a outros «de casa». E quem, sendo capaz de contemplar os vários passos de Jesus, não se maravilhará de vê-lo ora subir à montanha para proferir este discurso ou para realizar aquelas outras acções ou transfigurar-se, ora para, em baixo, curar os enfermos, incapazes de subir aonde o seguiam os seus discípulos? Não é porém este o momento de explicar quanto de verdadeiramente venerável e divino contêm os Evangelhos ou o sentido que Paulo tem de Cristo, isto é, da Sabedoria e do Logos de Deus[24]. Baste o que se disse, para contrapor a essa galhofa, indigna dum filósofo, de Celso, que ousa comparar os íntimos mistérios da Igreja de Deus «com os gatos, macacos, crocodilos, bodes e cães dos egípcios»[25].

 

Realcemos, de passagem, a antiga e clássica distinção esotérica que Orígenes faz entre «subir à montanha» (o caminho da Iniciação!), e o que se pode claramente fazer «na planície» aos «enfermos», isto é, aos incapazes de atingir, enquanto não «curados e purificados», a sublimação dos Mistérios. Noutro passo do mesmo livro, Orígenes aponta sem ambiguidades algumas chaves dos Mistérios com que podemos deparar nas Escrituras judaico-cristãs:

 

Se alguém deseja iniciar-se numa ciência misteriosa sobre o acesso das almas ao divino, não pelo que nos oferece a mais obscura seita citada por Celso, mas por livros originariamente judeus, lidos nas sinagogas, e que são aceites pelos cristãos, e por outros exclusivamente cristãos, leia as visões do profeta Ezequiel no final da sua profecia[26]; ou leia também, no Apocalipse de João, a descrição da Cidade de Deus, a Jerusalém Celeste, bem como a descrição dos seus fundamentos e das suas portas[27]. E se é capaz de entender por símbolos a senda assinalada aos que se hão-de encaminhar para o divino, leia o livro de Moisés que tem por título Números e procure quem o introduza nos mistérios que se encontram ocultos nos acampamentos dos filhos de Israel; averigue de que natureza eram os acampamentos ordenados às bandas do Oriente, que são os primeiros; de que natureza eram os orientados para Sul e Sudoeste, os que estavam junto ao mar e os que, por fim, se ordenavam a Norte[28]. Nestas passagens achará decerto ideias não despiciendas, e não, como imagina Celso, ideias que pedem ouvintes néscios e escravos. Compreenderá de quem nelas se fala bem como a natureza dos números aí indicados e que convêm a cada tribo. Expor aqui cada um destes pontos parece-nos inoportuno[29].

 

Finalmente, Orígenes não pode ser mais límpido quando afirma:

 

E de mais, que haja pontos além do exotérico que não chegam aos ouvidos do vulgo não é coisa exclusiva do Cristianismo, mas também corrente entre os filósofos, que tinham doutrinas exotéricas, e também outras esotéricas. Assim, de Pitágoras havia quem apenas ouvisse dizer: «Ele disse-o»; outros porém eram secretamente iniciados em doutrinas que não deviam chegar aos ouvidos profanos e não purificados. E quanto aos mistérios que se praticam em toda a Grécia e nas terras bárbaras, embora sejam ocultos, não os ataca Celso; por isso em vão tenta desacreditar o que há de oculto no Cristianismo e que não pode entender[30].

 

A necessidade da reformulação exotérica que vimos acima levou a Igreja a proceder a uma espécie de movimento translacional quanto ao sentido da palavra mistério, e aqui voltamos à tal distinção a que aludimos entre «mistério» e «mistérios» que a Igreja oficialmente adoptou e ensina: por um lado os mistérios enquanto grandes acontecimentos históricos da vida de Jesus ou da Virgem Maria, por exemplo os mistérios da Cruz ou os mistérios do Rosário; por outro, no mistério singularizado como por exemplo o mistério da Encarnação de Cristo, o mistério da Santíssima Trindade, o mistério da Eucaristia ou da Transubstanciação, o mistério Pascal, o mistério da Ressurreição. A palavra «mistério» ocorre 28 vezes no NT, 21 das quais nos textos paulinos, e em nenhum caso para exprimir o que acabámos de enumerar e que a Igreja oficializou: com o decorrer do tempo, o duplo significado de verdade divina e de rito sacro que o termo «mistério» abrangia acabou por se repartir por duas palavras, mysterium e sacramentum, ficando a primeira a designar as verdades ocultas do Cristianismo e a segunda os ritos ou as realidades sagradas. O que não exclui o poder que a Igreja detém para estabelecer, pelo mysterium, uma ponte real com o divino, poder que Cristo transmitiu aos apóstolos e que, por sucessão apostólica, é transmitido por sua vez ao longo dos séculos a todo o sacerdote regularmente ordenado[31].

É tempo entretanto de regressarmos a Paulo, que, confirmando quanto mais acima se disse sobre o originário esoterismo cristão, mui lisamente declara: «Se o nosso Evangelho está porém velado, está velado para os que se encontram no caminho da destruição, para aqueles incrédulos cujos pensamentos o deus deste século [gr. aiônos] cegou, para que neles não brilhasse a iluminação do Evangelho da glória de Cristo, o qual é imagem [gr. eikôn] de Deus» (2 Cor 4, 3-4). É importante pôr em relevo que foi o mesmo Paulo quem formulou, na sua primeira carta aos Coríntios e em duas frases fundamentais e fundamentantes, que as Escrituras cristãs nos dão dois Evangelhos, um exotérico e relacionado com a personalidade mundana: «Resolvi não saber coisa alguma, entre vós, senão Jesus Cristo, e este crucificado» (1 Cor 2, 2), e outro esotérico e relacionado com a individualidade espiritual: «Não sabeis que sois templo de Deus?» (1 Cor 3, 16). Destes «dois Evangelhos» foi o primeiro, como já fizemos notar, que a Igreja católica trouxe à luz da ribalta, e manteve, com o carácter que conhecemos e que tem sido a permanente tónica da sua doutrina cristã[32].

Inácio, bispo de Antioquia martirizado em Roma no ano 107 ou 108, foi Padre Apostólico (vir apostolicus), isto é, conheceu e conviveu pessoalmente com alguns apóstolos, afirma-o João Crisóstomo: «Inácio, em primeiro lugar, conviveu nobremente com os Apóstolos e das presenças deles se gozava como fontes do Espírito. Ora pois, que muito é que quem com eles convivia e com eles a todas as horas lidava, e participava dos seus públicos e secretos pensamentos, fosse finalmente tido por digno de tão alta dignidade?»[33].

Inácio, na sua juventude, decerto teria conhecido Paulo (além de João, e talvez outros), pois sendo Antioquia a sua pátria, e tendo sido de Antioquia que irradiou para o mundo mediterrânico a mensagem de Paulo, os seus caminhos, com toda a probabilidade, ter-se-iam cruzado. O testemunho de Inácio, portanto, convém considerar-se com especial atenção, nomeadamente — e para o caso que nos importa — o seguinte passo duma carta que endereçou à comunidade cristã de Éfeso, onde a recordação de Paulo permanecia muito vívida:

«Sois passagem para os que se elevam a Deus, iniciados com Paulo nos mesmos mistérios [gr. Paulou summusai]» (Carta aos Efésios XII, 2).

Aquelas palavras gregas, Paulou symmysai, também se podem traduzir por «companheiros de iniciação de Paulo». Ou seja, os Mistérios cristãos eram um facto, e uma das provas mais evidentes dá-nos o próprio Paulo, quando afirma de si:

 

Sei de um homem, em Cristo, que há catorze anos — ignoro se no corpo, ou fora dele, Deus o sabe — foi arrebatado até ao Terceiro Céu. E sei desse homem — se no corpo ou fora dele, não sei, Deus o sabe — que foi arrebatado ao Paraíso e ouviu palavras inexprimíveis [gr. arrhêta rhêmata, lat. arcana verba] que não é permitido a um homem divulgar». — 2 Cor 12, 2-4.

 

Este texto surpreendente de Paulo revela um facto em que muitos cristãos certamente nunca pensaram, e dá sobretudo conta, com muita força, do que é o segredo iniciático, as tais «palavras inexprimíveis» que o Iniciado recebe e não pode repetir no mundo profano. Recordemos que a expressão que Paulo usa para o inexprimível e incomunicável — arrhêta —, é a mesma que é utilizada nos mistérios antigos exactamente com o mesmo significado[34]. Não deixa de ser sintomático que Jerónimo, conhecedor dos primitivos Mistérios cristãos, tenha traduzido, na sua Vulgata Latina, aqueles dois vocábulos gregos, arrhêta rhêmata («palavras impronunciáveis ou inefáveis»), por arcana verba, expressão muito mais forte, pois significa «palavras ocultas ou secretas».

A crítica positivista, ignorando o alcance iniciático deste texto, assume perante ele uma de duas atitudes: ou opina que se trata apenas dum ancestral tema mítico (as esferas do céu!) que permaneceu no NT a par doutros como por exemplo a batalha celestial entre anjos e demónios (Ap 12, 7-9); ou limita-se a constatar que Paulo mentiu, porquanto, a fazer fé no Evangelho de João, «ninguém subiu ao Céu a não ser Aquele que desceu do Céu, o Filho do homem» (Jo 3, 13).

Pois nem uma coisa nem outra: por esta revelação ficamos a saber que Paulo era um Iniciado com o grau equivalente à 5.ª Iniciação menor da Ordem Rosacruz: esta é a Iniciação que dá acesso ao Mundo do Pensamento Abstracto, ou Terceiro Céu, na terminologia iniciática cristã e Rosacruciana[35]. E tal como nas doutrinas Rosacruzes, Paulo admite deidades ou Hierarquias a que chama «deuses», inferiores ao Deus único e a Ele submetidos: «Porque, se há aqueles que são chamados deuses, tanto no céu como na terra, havendo assim muitos deuses e muitos senhores, para nós porém não há senão um Deus, o Pai, de quem procedem todas as coisas» (1 Cor 8, 5-6).

Muito exemplos se poderiam colher dos textos de Paulo; remato com o seguinte passo da primeira carta aos Coríntios, que bem merece leitura atenta e profundada, e que já vimos, atrás, ter sido objecto de misterioso exame tanto de Clemente de Alexandria como de Orígenes:

 

Entre os perfeitos [gr. en tois teleiois] porém, falamos sabedoria; não a sabedoria deste século nem a dos chefes deste século condenados a perecer; mas falamos a sabedoria de Deus em mistério, a oculta, que Deus predestinou antes dos séculos para glória nossa; que nenhum dos chefes deste século conheceu; pois se a tivessem conhecido, nunca teriam crucificado o Senhor da glória. Mas como está escrito:

O que olho não viu nem ouvido ouviu,

Nem subiu ao coração do homem,

Essas coisas preparou Deus aos que o amam [Is 64, 3].

A nós no-lo revelou Deus por meio do Espírito; porque o Espírito tudo penetra, mesmo as profundezas de Deus. Quem pois conhece dos homens as coisas próprias do homem, a não ser o espírito do homem que nele se encontra? Assim também as coisas de Deus ninguém as conhece a não ser o Espírito de Deus. Nós porém não captamos o espírito do mundo mas o Espírito que vem de Deus, para que conheçamos as coisas que Deus graciosamente nos deu, as quais falamos não com aprendidas palavras de sabedoria humana, mas com aprendidas do Espírito, agregando o espiritual ao espiritual. Mas o homem vivente [gr. psychikos anthrôpos, lat. animalis homo] não capta as coisas do Espírito de Deus, pois são loucura para ele, nem é capaz de entendê-las pois só espiritualmente é possível examiná-las. Em contrapartida o homem espiritual [gr. pneumatikos, lat. spiritalis] ajuíza todas as coisas, mas ninguém é capaz de ajuizá-lo. Quem pois conheceu o pensamento do Senhor, para que o instrua? Nós porém temos o pensamento [gr. noûn, lat. sensum] de Cristo. — 1 Cor 2, 6-16.

 

 Os «perfeitos» a que se refere Paulo são os Iniciados (teleioi) dos Mistérios Maiores, os mesmos «perfeitos» que Orígenes invoca num outro texto seu que também a este se reporta e que só o entenderá quem disso for capaz, como ele próprio adverte:

 

… Platão põe em terceiro lugar a imagem; nós porém, aplicando o nome de imagem a outra coisa, diremos mais claramente que a impressão das chagas que depois do Logos se dá na alma, é o Cristo que mora em cada um, e vem do Cristo Logos. Ora bem, a sabedoria, que é Cristo e mora nos perfeitos [gr. en tois teleiois] de entre nós, corresponde ao quarto elemento platónico, que é a ciência, entenda-o quem disso for capaz[36].

 

Nos livros canónicos do NT não se dá conta de como Paulo terminou os seus dias. O que se sabe, ou julga saber, é-nos transmitido pelos apócrifos, nomeadamente os Acta Pauli, que incluem o Martyrium Pauli, e os fragmentos que nos restam dos Actos de Pedro e Paulo: teria sido levado para Roma e decapitado no ano 67 nas Aquae Salviae, na localidade que hoje se chama Tre Fontane. A descrição da sua morte no Martyrium Pauli inspirou, ao longo dos tempos, tanto a arte como a liturgia: «Paulo então pôs-se de pé e olhou para leste, ergueu as mãos ao céu e orou demoradamente. Nas suas orações falava em hebraico com os Padres; depois, sem proferir palavra, ofereceu o pescoço ao verdugo. E quando este lhe cortou a cabeça, salpicou leite sobre a túnica do soldado»[37].

Os poetas, no entanto, têm uma visão diferente. Tal como Elias, tal como Enoch, o trespasse de Paulo, o Iniciado, não podia acrisolar-se em cadinho de terrestre cruz, mas apenas em luminoso raio de celestial mistério: «Paulo não podia morrer, como Pedro. Desapareceu nas alturas donde recebera a inspiração. O seu amor a Jesus Cristo alcançou a Eternidade e todos os atributos de Deus. Paulo é imortal em Jesus Cristo. Não morreu, desapareceu. Aparecer é ganhar forma no espaço, e duração no tempo. Desaparecer é ficar invisível, simplesmente»[38].

 

 

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[Segue-se o segundo capítulo exemplificativo que já se encontra na Net: “Graal Branco, Graal Negro”]

 


 


 

[1] Ernst Wilhelm Benz, «Christian Doctrine», in Macropædia (ed. cit.), vol. 16, p. 293.

[2] Afonso Botelho, Ensaios de Estética Portuguesa, Lisboa 1989, p. 69.

[3] Karl Kerényi, Die antike Religion (1952), trad. esp. por Mª P. Lorenzo e M. L. Rodriguez: La Religión Antigua, Madrid 1972, pp. 166-167.

[4] René Guénon, Aperçus sur l’Initiation (ed. cit.), p. 89.

[5] Max Heindel, The Rosicrucian Philosophy in Questions and Answers, vol. 2, Oceanside 1947, p. 227.

[6] V. supra, pp. 63-64.

[7] Fermin Vale Amesti, Le Retour d’Henoch ou la Maçonnerie qui Revient, Paris 1993, p. 73. — V. infra, p. 303, os níveis de acesso aos mundos supra-sensíveis por parte dos Irmãos leigos e dos Adeptos dos Mistérios Rosacruzes.

 

[8] Cf. Antoine Faivre, Accès de l’ésotérisme occidental, reed. revista, Paris 1996, vol. I, todo o capítulo intitulado «Les débuts de l’ésotérisme chrétien», pp. 65 a 72.

[9] René Guénon, Aperçus sur l’Ésoterisme Chrétien, reed. Paris 1988, pp. 109-110. — Nesta ambiguidade incorre Annie Besant (1847-1933) no título do seu livro Esoteric Christianity (Londres 1901), cuja tradução é precisamente «Cristianismo esotérico». Devo salientar, todavia, que se trata dum livro muito bem construído e muito bem informado, e com um bom conhecimento das fontes. Pena é que para além do duvidoso ponto de vista assumido no título, a autora, que é uma investigadora competente e minuciosa, cometa alguns erros graves, por exemplo em todo o capítulo sobre o «Cristo histórico», onde reproduz a fantasiosa lenda de que Jesus teria nascido no ano 105 a. C., além duma catadupa de factos «históricos» que muito deixam a desejar.

[10] V. citação supra, p. 32.

[11] René Guénon, Aperçus sur l’Ésoterisme Chrétien (ed. cit.), pp. 28-29.

 

[12] Refere-se ao passo do Evangelho de Mateus (Mt 16, 5-12) em que Jesus advertiu os discípulos que se acautelassem do fermento dos fariseus e saduceus; muitos dos discípulos tomaram-no à letra e pensaram que aludia ao pão. Jesus chamou-os «homens de pouca fé» e explicou-lhes que não se referia ao pão, mas à doutrina.

[13] Aqui Clemente estabelece uma comparação com os Mistérios de Elêusis, dedicados a Deméter, a terra-mãe, e a Perséfone ou Koré («donzela»), a vegetação sua filha. Quando o iniciado nestes Mistérios recebia a revelação, era envolvido por uma luz resplandecente.

[14] Este versículo de Mateus é apresentado como chave para o entendimento da obra De occulta philosophia (1530-1533), de Agrippa von Nettesheim (1486-1535), que o coloca em epígrafe no frontispício da sua obra sob a seguinte forma: «Nihil est apertum quod non reveletur et occultum quod non sciatur. Matthaei. X».

[15] O tirso era uma vara transportada nos Mistérios Dionisíacos, encimada por uma pinha e engrinaldada de hera, e utilizada para comunicar o êxtase. «Aquele que foi tocado pelo tirso» é, naturalmente, o iniciado a quem se lhe abriu a janela para o mundo supra-sensível: «A glândula pineal (o “terceiro olho”), com a sua forma cónica no topo da coluna espinhal, é representada pelo tirso, essa misteriosa vara dos Mistérios Dionisíacos composta por uma pinha de pinheiro fixada numa haste de funcho; a finalidade da Iniciação Dionisíaca seria despertar aquela faculdade, tornando o iniciado consciente da grande mente cósmica de que o seu intelecto é uma parte» — Joscelyn Godwin, Mystery Religions in the Ancient World, Londres 1981, pp. 133-134.

[16] Clemente de Alexandria, Stromateis, I, 1, 13-14.

[17] Refere-se a um texto fundamental de Paulo (1 Cor 2, 4-16), que transcrevemos mais adiante: v. infra pp. 118-119.

[18] Refere-se a um texto de Isaías onde se descreve, simbolicamente, um momento preciso duma certa fase do percurso iniciático: Is 6, 1-8.

[19] Refere-se ao conhecido passo do Sermão da Montanha: Mt 7, 6.

[20] Refere-se ao seguinte passo do Evangelho de João: «Era a luz verdadeira, a que ilumina todo o homem vindo a este mundo» (Jo 1, 9).

[21] Ver nota 140.

 

[22] Clemente de Alexandria, Stromateis, I, 12, 55-56.

[23] Refere-se ao passo do Evangelho de Marcos citado mais acima: Mc 4, 11.

 

[24] Ver nota 140.

[25] Orígenes, Contra Celsum, III, 21.

[26] Ver Ez 48, 30-35.

[27] Ver o capítulo 21 do Apocalipse, no NT.

[28] Ver o capítulo 2 do livro dos Números, no AT.

[29] Orígenes, Contra Celsum, VI, 23.

[30] Orígenes, Contra Celsum, I, 7.

[31] V. infra pp. 241-242.

 

[32] William Kingsland, The Esoteric Basis of Christianity, Londres 1895, p. 156. — Os conceitos de «individualidade» e de «personalidade» têm um determinado significado quando integrados num contexto doutrinário místico ou ocultista, e outro muito diferente quando encarados de um ponto de vista da psicologia e da psico- sociologia. No primeiro caso a tónica é posta na espiritualidade, e no segundo na materialidade. Assim, de um ponto de vista quer oculto quer místico, a individualidade é o Eu superior, a tríade espiritual do ser humano considerada como uma unidade, conglobando os três aspectos espirituais que nas doutrinas Rosacruzes se chamam Espírito Divino, Espírito de Vida e Espírito Humano, e que são como que projecções tri-unitárias, respectivamente, do Pai, do Filho e do Espírito Santo no mesmo indivíduo e que constituem a sua real essência. É, naturalmente altruísta, e a sua nota-chave é o dar. A personalidade é o Eu inferior, e é constituída pelo conjunto do corpo vital ou etérico, do corpo astral ou de desejos, sede dos sentimentos e emoções, e da mente, além do corpo físico, sendo este conjunto a parte evanescente, mortal, que o Espírito imortal usa para se exprimir. É, naturalmente egoísta, e a sua nota-chave é o receber. — Por outro lado, e segundo uma abordagem psicológica e psico-sociológica, constatamos que as definições de «personalidade» e de «individualidade» variam consoante as escolas e respectivas teorias, mas duma forma geral a ênfase é posta na «personalidade», que traduz a globalidade do indivíduo, o seu carácter, atitudes, opiniões, em suma, o seu comportamento perante si próprio, perante o ambiente e perante o grupo social onde se insere. Por sua vez a «individualidade» psicologista afirma-se, grosso modo, pela valorização da liberdade e do ego, caracterizando-se por um egoísmo natural e um sistema de valores centrado em si próprio e no pequeno círculo familiar e de amizades do indivíduo em causa. — Esclareça-se desde já que usarei estes dois termos, sempre, nas acepções tanto místicas como ocultistas que descrevi em primeiro lugar. Por outro lado, o ego da teoria psicanalítica (o ponto central da personalidade psicologista, capaz de percepções e que actua perante o mundo externo, físico e social), não deve confundir-se com o «Ego» das doutrinas místicas e ocultas, que equivale ao triplo-Espírito do «Eu superior».

[33] Citado em: Daniel Ruiz Bueno, Padres Apostólicos: Edición Bilingüe Completa, 5.ª ed. Madrid 1985, p. 383.

[34] V. supra, p. 108.

 

[35] Max Heindel, The Rosicrucian Cosmo-Conception (ed. cit.), p. 528.

 

 

[36] Orígenes, Contra Celsum, VI, 9.

[37] Citado em: Johannes Quasten, Patrologia, vol. I (ed. cit.), p. 138.

[38] Teixeira de Pascoaes, São Paulo (1934), 3.ª ed. Lisboa 1984, p. 247.

 

 - Extraido de "Instruções Iniciáticas" , de Antonio de Macedo. Publicado pela Ed. Hugin, Lisboa, 2000.

 

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