AS ÚLTIMAS HORAS DE UM ESPIÃO

Por Max Heindel

 

 

“Há mais coisas no Céu e na Terra do que sonha a nossa vã filosofia”

                                                                       -William Shakespeare

 

Ele estava sentado no jardim em ruínas de um antigo mosteiro, olhando para a mistura de flores e ervas daninhas, crianças bem cuidadas e crianças abandonadas; as últimas pareciam estar levando a melhor desde que a guerra afastou os antigos proprietários, pois os soldados que aí acampavam no momento não tinham tempo para flores.

Ele não era um deles; ele era um prisioneiro, um espião. Apanhado com importantes documentos, foi sentenciado a ser fuzilado e estava então aguardando o pelotão de fuzilamento que iria dar fim a tudo.

Porém, iria tudo terminar? Que pergunta tola. Ele foi educado a acreditar em algo posterior, mas logo após entrar na Universidade, ele adotou a atitude mental comum, a da mente científica que prevalecia naquela instituição. O criticismo superior tinha provado a falácia da Bíblia. Na sala de dissecação, a maquinaria mecânica do corpo ficou evidente e a química podia explicar as ações e reações do organismo. A psicologia oferecia uma explicação suficientemente ampla sobre as maravilhas da mente; em resumo, foi provado que o homem era uma máquina pensante móvel, capaz até de se perpetuar por meio de sua descendência, que assumia os trabalhos quando a máquina genitora estava gasta e era despachada como sucata ao cemitério. Soberano ou vassalo, mestre ou aprendiz, santo ou pecador, todos eram senão sombras sobre a moldura do tempo.

Mas, de algum modo, ele não estava tão certo disso desde que a guerra o tinha colocado face a face com a morte em massa. Ele tinha observado centenas morrerem no campo de batalha, nas trincheiras e nos hospitais, e a convicção absoluta deles sobre a vida após a morte era, no mínimo, perturbadora. Poderia haver algo de verdadeiro na asserção deles de que tinham visto “Anjos”, quer nos campos de batalha, quer em seus leitos de morte? Qual, isso era uma alucinação devida à tensão causada pela situação. Entretanto, tantos tinham presenciado estas coisas, companheiros como o Tenente K e o Capitão Y, intelectuais e frios, sendo que o Capitão nunca mais praguejou depois desse dia no Marne; mais do que isso, passou a carregar consigo um livro de orações e pregou um verdadeiro sermão a um sargento por sua língua ferina. E existiram outros exemplos.

Bem, ele cedo saberia; às cinco, ele estava destinado a enfrentar o pelotão de fuzilamento.

Ele foi ao quarto onde tinha dormido a noite anterior. O guarda, que tinha permanecido na entrada do aposento enquanto ele estava fora, seguiu-o, de rifle na mão, e observou-o enquanto ele se atirava sobre o rude catre. Ele olhou para cima e viu uma cópia da famosa tela de Leonardo da Vinci, “A Última Ceia”. Ele nunca tinha sido particularmente aficionado da arte, mas algo parecia atraí-lo ao Cristo naquele momento. Ele tinha sido indubitavelmente um nobre caráter. Ele foi um mártir por uma causa e esse quadro da Última Ceia evidenciou a analogia entre Cristo e o homem no catre, pois ele também estava compartilhando da generosidade da Terra pela última vez.

Então, veio à sua mente, a história de como Leonardo da Vinci tinha pedido a um amigo para criticar a pintura quando concluída e o amigo advertiu-o sobre a incongruência dos copos dispendiosos em que os apóstolos bebiam. Da Vinci esfregou seu pincel sobre eles e suspirou; ele tinha posto todo o seu coração e toda a sua alma na face do Senhor, e tinha tido esperança que essa face gloriosa atrairia a atenção dos espectadores e ofuscaria as demais coisas; em vez disso, um dos detalhes mais insignificantes tinha atraído a atenção de seu amigo, excluindo até o Senhor da Glória.

“Será esse o meu caso?” pensou aquele que jazia sobre o catre. “Será que concentrei meu olhar sobre as coisas sem importância da vida? Tenho pensado sobre a morte muito freqüentemente para sentir temor agora que minha vez chegou; entretanto, há tanto ainda a fazer neste mundo que é desagradável pensar no esquecimento.”

“Cristo disse, `Mas somente uma coisa é necessária´, e se Ele estiver certo, então eu fui como o amigo de Da Vinci, minha atenção foi dirigida a coisas não essenciais. Em vez de buscar as coisas eternas, eu comprometi todo o meu tempo com tarefas materiais.”

“Hei, para que esse devaneio? Se eu continuar assim, meus joelhos começarão a tremer quando o pelotão de fuzilamento aparecer.”

Ele se levantou e, seguido pelo atento guarda, voltou ao jardim onde foi atraído por um antigo relógio solar. Ele leu a inscrição: oros non numero nisi serenas ( eu registro somente as horas ensolaradas).

“Que ditado bom, esquecer todas as coisas pequenas e sórdidas da vida e reconhecer somente o bom, o verdadeiro e o belo!”. Olhando para sua vida, agora prestes a terminar, quão próximo ele viveu desse ditado? A consciência o força a confessar que ficou distante disso.

Mas, agora era tarde. Perdido na contemplação, seus olhos ficaram presos à sombra projetada pelo sol no mostrador. Havia algo misterioso em torno de seu silencioso progresso, rastejando em direção às fatais cinco horas quando o pelotão deveria aparecer.

Ele não estava preocupado com a morte, mas começou a agarrar-se ao problema da vida, apossando-se dele um insuportável desejo por uma solução. Mas havia essa sombra no mostrador do relógio, “este nada intangível”, rastejando-se cada vez mais com lenta mas fatal força. Ó! Bem que ele poderia ter a chance de buscar luz para lançar sobre o problema da Vida!

Era costumeiro executar ao amanhecer os condenados sob a lei marcial, mas ele fôra polidamente informado que uma movimentação ordenada repentinamente para a divisão que o mantinha prisioneiro tinha ocasionado um inesperado atraso, que faria com que ele tivesse que enfrentar o pelotão de fuzilamento ao pôr do sol. Na ocasião, ele respondeu com um menear de cabeça e um dar de ombros. O que importava? Mais cedo ou mais tarde, ele estaria preparado. Agora estava começando a desejar essas horas a mais em que poderia raciocinar.

Quando se afastou da sombra da morte no mostrador do relógio, seu silencioso progresso parecia mais eloqüente que qualquer sermão sobre a evanescência da vida e a inexorável certeza da morte.

De novo, estendeu-se sobre o catre para pensar sobre o problema de sua existência. Em menos de meia hora, estaria sabendo tudo ou nada; se seria aniquilado tão logo a luz da vida fosse extinta pela bala, que inevitavelmente atingiria seu coração, ou, então, seria um espírito livre. Tudo dependeria de qual das duas teorias seria a verdadeira.O sentimento de “suspense” estava crescendo com maior intensidade a cada momento e o anelo pela vida sendo tão grande a ponto de tornar-se doloroso. De todas as pessoas que professaram sua fé na imortalidade da alma, nenhuma parecia saber o assunto; todos acreditavam apenas  -  isto é, todos com exceção de um.

E, então, irrompeu em sua memória a lembrança de um encontro com um homem de uma estranha e fascinante personalidade, em uma popular estância de praia em que foi descansar, em certa ocasião, quando seus nervos não suportavam um extenuante estudo de um assunto científico. Esse homem, tranqüilo, refinado e modesto, atraiu sua atenção desde o início e, em uma ocasião em que a conversa de ambos derivou para as teorias da vida, ele adotou um ponto de vista materialista, tendo o estranho confrontado com um número de argumentos aparentemente irrespondíveis. Todavia, não era a força dos argumentos que o impressionava agora e sim a lembrança da voz de autoridade, das maneiras e da conduta daquele que sabia do que estava falando, o que o fez ficar possuído de um ardente desejo de investigar.

“Será que o estranho saberia de tudo, real e verdadeiramente?”

Ele tinha falado de homens que “deixam seus corpos à sua vontade do mesmo modo que nos despojamos de um roupão quando mergulhamos na água para nadar”. “Assim”, disse ele, “procedem também aqueles que entram em certos mundos invisíveis”.

Ele tinha chamado isto de “A Terra dos Mortos que Vivem” e tinha afirmado que os assim chamados mortos ali funcionavam em um veículo mais sutil, de posse de todas as suas faculdades e com pleno conhecimento e memória das condições que existiam em torno deles quando viviam esta vida. Ó, se esse estranho pudesse estar aqui, agora, e ele pudesse falar com ele de modo a descobrir mais sobre esse assunto que assumiu, então, tamanha importância em sua mente...

Mas, o que foi que apareceu no canto? Seria o estranho aquela nebulosa e difusa forma no canto escuro distante? E agora parecia ouvir uma voz dizendo, “eu o encontrarei quando você deixar seu corpo”. Então a figura desapareceu.

Ó! Isso deve ter sido uma fantasia de sua imaginação, uma alucinação de seu cérebro desordenado, ele pensou. O desejo deve tê-lo feito ver coisas; ele não mais especularia. E, de novo, ele voltou ao jardim para observar o mostrador do relógio solar à medida em que sua sombra se arrastava em direção às cinco horas fatais.

Ali o encontraram, com um vivo sorriso em seus lábios, quando saudou o oficial do pelotão e pediu para ser poupado do ignominioso processo de vendar os olhos. Juntos, caminharam em direção ao muro no extremo do jardim onde ele se voltou para enfrentar o pelotão no momento em que o oficial se perfilou e rapidamente deu a ordem de comando que fez lançar a bala que encontrou seu coração.

*    *    *    *    *

Ele ouviu a detonação dos fuzis e sentiu uma pontada de dor como se um ferro em brasa tivesse secado sua alma. Em seguida, sentiu um forte puxão e, involuntariamente, sua mão procurou seu coração, mas, que estranho, antes de ela ter alcançado seu peito, a dor já havia passado e, rapidamente, ele retornou seu braço à posição alinhada ao longo do corpo. Ele não podia deixar que os inimigos de sua pátria pensassem que ele era um covarde.

Novamente, ele voltou sua atenção para o pelotão de fuzilamento, aguardando momentaneamente sentir o impacto das balas que ele já havia sentido por antecipação, pois, de nenhum outro modo ter-se-ia dado conta do impacto e da dor em seu coração.

Mas, o que significava isso? O pelotão de fuzilamento permanecia perfilado e o oficial dele se afastava, abandonando o local.

Teriam sido tiros de festim? Não, isso seria impensável. Ele examinou suas roupas e encontrou três furos em seu casaco bem acima do coração. Introduziu seu dedo em um deles até onde pôde e retirou-o novamente, admirado com a ausência de sangue ou dor. Evidentemente, ele havia sido atingido por três balas e, de acordo com todos os cânones da experiência, ele deveria ter desabado como um fardo e morrido instantaneamente e, no entanto,  ali estava ele mais vivo do que nunca. Como poderia ser?

Num impulso, ele correu atrás do oficial que se afastava, agarrou-o pelo braço e pediu uma explicação, mas o oficial parecia não se importar, nem com a mão que o segurava nem com a inflamada pergunta, continuando a caminhar na direção de seus homens como se nada tivesse ouvido ou sentido.

“Estarei sonhando, louco ou o quê?”

“Nada disso, meu amigo”, respondeu uma voz a seu lado, e ele, ao se virar, viu que lá estava o estranho. “Sou um Rosacruz”, ele se identificou. Com um profundo sentimento de alívio, o espião voltou-se para o estranho. Talvez ele pudesse derramar alguma luz sobre aquela desconcertante experiência.

“Mas como você chegou até aqui? Não o vi entrar com o pelotão de fuzilamento.”

“Seus olhos ainda não estavam sintonizados com as vibrações do Espírito; você estava cego pelo véu da carne”, veio a resposta, mas sem que, com isso, o espião demonstrasse o menor sinal de compreensão, o que o fez começar a duvidar da sanidade mental de sua companhia.

“Vejo que você não está entendendo; o que eu lhe disse só fez aumentar sua perplexidade”, prosseguiu o estranho; “você não percebe que está morto.”

“Morto! Com toda a certeza você deve estar louco. Como posso estar morto se estou aqui diante de você e ainda conversando?”, perguntou o espião, mais perplexo do que  nunca.

“Não me expressei de modo adequado; deveria ter dito: `o seu corpo está morto´, respondeu o Rosacruz.

Mas o espião olhou-o espantado, no mais profundo abandono  e desesperança; tudo estava cada vez mais desconcertante; um dos dois havia perdido a razão, senão ambos.

“Meu corpo está morto! Mas como você pode afirmar tal coisa? Não estou eu aqui, de pé, movendo meus lábios e lhe falando? Posso mexer os braços e pernas e caminhar tão bem quanto você, embora tenha que confessar que estou atônito por saber que estou vivo com três balas no meu coração.”

“Percebo sua perplexidade, meu amigo, e logo lhe darei explicações, mas primeiro venha comigo ao lugar onde você esteve de frente para o pelotão de fuzilamento; há algo lá de seu interesse.”

Juntos caminharam para o lugar.

“Olhe ali entre as flores, meu amigo”, disse o Rosacruz.

E, quando seguiu a direção do olhar do outro, o espião viu, parcialmente escondido pelas plantas altas e pelas flores que cresciam tão compactamente no jardim, o que parecia ser ele mesmo de bruços. Ele dobrou-se e procurou virar o corpo caído para resolver esse dilema impossível, porém, perplexidades pareciam se acumular sobre perplexidades, indefinidamente, pois, quando tentou segurar a forma inerte pelo ombro para levantá-la, sua mão penetrou através dela como se fosse feita de ar e não de carne e osso.

Novamente, levantou-se e virou-se para sua companhia.

“Pelo amor de Deus, desembarace este emaranhado para mim, pois se já não estou insano, enlouquecerei no próximo minuto!”

“Paciência, meu amigo”, respondeu o Rosacruz, “está tudo bem e o deixarei à vontade em poucos minutos. O que aconteceu foi o seguinte:

Quando o pelotão de fuzilamento disparou os tiros fatais, três balas entraram em seu coração com tal efeito que você sentiu a dor por uma fração de segundo antes que o corpo etéreo que você está agora usando fosse libertado de seu corpo físico, que caiu então para frente, de rosto para o chão. Desde então, este corpo etéreo lhe servirá tão bem ou melhor que o corpo denso do qual você se desfez com a morte.”

“Corpo etéreo”, balbuciou o espião, ainda sem poder entendê-lo.

“Sim, meu amigo. Parece assim tão estranho que o homem possua um corpo etéreo? A ciência formula a hipótese de que todas as coisas desde o mineral mais denso ao gás mais rarefeito acham-se permeadas de éter, e essa é uma hipótese correta. O corpo humano não é uma exceção à regra; também está interpenetrado de éter. Quando ele escapa, a morte ocorre, como foi demonstrado pelo Dr. Mc Dougall há uma década atrás no Hospital Geral de Boston, quando ele colocou na balança um certo número de pessoas prestes a morrer e eles acusaram, invariavelmente, uma perda de peso no momento em que expiraram.

O que os médicos e cientistas não sabem é que esse éter permanece na mesma forma e semelhança do corpo denso do morto e continua sendo a morada do Espírito eterno , embora invisível para aquele que ainda está em seu corpo físico.”

Uma grande luz e um olhar de intenso alívio brilhou na face do espião. “Mas como o éter passou através de minhas roupas, já que estou usando o mesmo traje do meu corpo inerte, e como os furos das balas reproduziram-se em minhas roupas atuais?”

“Trata-se de um truque da mente sub-consciente, meu amigo”, respondeu o Rosacruz. “embora você não esteja ciente do dano sofrido por seu corpo, as circunstâncias exatas foram registradas num pequeno átomo localizado em seu coração quando você deu seu último suspiro ao morrer, pois, a cada inspiração que fazemos, levamos aos pulmões o ar que contém o éter que carrega uma imagem de tudo o que nos cerca, seguindo o mesmo princípio da fotografia que é levada para a placa sensível existente na câmera. O éter entra na corrente sangüínea que o leva ao coração. Lá, o átomo-semente corresponde ao filme fotográfico, cada inspiração sucessiva produzindo uma nova imagem e, assim, acha-se impresso sobre esse pequeno átomo uma série de quadros da vida desde o berço até a sepultura. Isso modela o nosso destino após a morte e é a base oculta do ditado: `Como o homem pensa em seu coração, assim ele é ´. Quando a chamada `morte´ o retira de seus corpos, o éter reproduz suas roupas; reproduz as peculiaridades físicas com absoluta fidelidade, seguindo o modelo da última imagem gravada no átomo-semente, a alma do qual o homem leva consigo como o árbitro de sua vida no futuro.”

O espião permaneceu em silêncio e perdido em seus pensamentos por algum tempo, analisando a explicação do Rosacruz de todos os ângulos. Pareceu-lhe perfeitamente correto, lógico e em harmonia com as novas descobertas da ciência. Nem era uma insuperável dificuldade o átomo-semente mencionado pelo Rosacruz ser de dimensões tão diminutas. Não tem o olho de uma mosca numerosas facetas, cada uma delas tomando uma imagem do ambiente, e o microscópio não revelou o mundo das coisas diminutas? Quem se atreveria a estabelecer o limite?

“Mas eu tenho que ficar para sempre com furos em minha roupa e ferimentos no meu peito, ou eles vão se curar e eu vou poder procurar outra roupa?”

“Nada disso, meu amigo. Como já lhe falei, aqui na Terra dos Mortos que Vivem é lei que o que o homem pensa em seu coração, assim ele é. Os pobres rapazes que tombaram aos milhares nos campos de batalha, horrivelmente mutilados, no princípio da guerra estavam terrivelmente angustiados com seus estados até lhes ensinarmos a pensar neles como eram antes de virem para a guerra, fortes e saudáveis. Foi uma tarefa difícil faze-los acreditar que isso era tudo o necessário para restaurar-lhes a uma condição sadia e foi um serviço moroso, pois eram muitos os necessitados e nós, muito poucos. Mas, aos poucos, eles foram ficando convencidos e em condições de ajudar outras vítimas da guerra até que, agora, há centenas de ajudantes prontos para cuidar e ajudar centenas de mortos.”

“Ah! Você é um aluno perspicaz. Vejo que já remendou sua roupa e sarou seus ferimentos.”

“Sim”, respondeu o espião, “e muito obrigado. Nunca poderei pagar-lhe pelo alívio que me deu. Mas tenho uma dificuldade. Como é isso de meu corpo parecer o diáfano ar e minhas mãos passarem através dele? Eu sei que ele é sólido.”

“Pois é! Isso é engraçado; as pessoas no mundo físico pensam que os chamados fantasmas são compostos de matéria intangível e diáfana como uma espiral de fumaça, isto é, se é que eles tomam conhecimento de sua existência. Pensam que seus corpos são sólidos como uma pedra. Mas, uma vez que transpassam o véu para a Terra dos Mortos que Vivem, ficam chocados ao descobrir que as pessoas ainda em seus corpos físicos são tão imateriais para nós como somos para eles, e que é tão fácil para nós atravessa-los com um braço quanto é para eles passarem através de nós. De fato, eles tanto parecem fantasmas para nós quanto nós para eles.

Você é agora um cidadão da Terra dos Mortos que Vivem. Venha, vamo-nos daqui para conhecer o lugar. Mas primeiro, há alguém com quem gostaria de falar? Pois o seu corpo espiritual estará mais denso nas próximas horas do que em qualquer outra ocasião durante sua existência post-mortem e, portanto, será mais fácil você se dirigir a seus amigos agora do que em qualquer outra oportunidade.”

“Tenho uma irmã, porém, ela vive na cidade X que dista daqui uns dez mil quilômetros. Por aqui, não tenho ninguém que me conheça e que se importasse com a minha morte.”

“A distância não é barreira para o Espírito”, disse o Rosacruz. “Imagine-se nesse lugar, que estaremos na casa de sua irmã em dois minutos.”

E eles se deslocaram juntos, embora para o espião não parecesse muito grande a velocidade quando sobrevoaram cidades e aldeias umas após as outras. Pareceu-lhe ter tempo bastante para observar os vários detalhes da região, a arquitetura das casas, o modo do povo se vestir, etc. Ao passar sobre uma grande extensão de água, notou muitos navios com suas tripulações e passageiros envolvidos em diversas tarefas e lazeres. Na verdade, o tempo não se lhe afigurou longo ou curto; o tempo pareceu inexistente à sua consciência e maravilhou-se consigo mesmo por ter encarado tudo isso tão naturalmente como se em toda a sua vida tivesse estado flutuando pelo ar, vendo as coisas que agora observava.

Mas algo pareceu-lhe estranho e o incomodou um pouco a princípio: o fato de o espaço parecer povoado de espíritos, tal qual ele mesmo e o Rosacruz, flutuando através deles. No princípio, ele tentou evita-los, mas percebeu ser impossível; ele se retesou diante de uma colisão quando, para sua surpresa, verificou que aquelas pessoas passavam flutuando através dele e seu companheiro como se eles não existissem. No momento, isso o encheu de consternação e perplexidade até que o Rosacruz, observando seu dilema, riu confiantemente e ordenou-lhe que não se preocupasse, acrescentando que aquele era o costume na  Terra dos Mortos que Vivem, pois lá todas as formas eram de certo modo plásticas, que se interpenetravam facilmente todas as vezes, e que não havia perigo algum de alguém perder a identidade.

Chegando à casa da irmã dele, encontraram-na sentada numa confortável sala de estar. O espião correu impulsivamente para abraçá-la apenas para constatar, para seu desalento, que ela estava absolutamente inconsciente de sua presença e que as mãos dele, em vez de apertar as dela, passaram direto através das mesmas.

De novo, ele se virou para o Rosacruz e perguntou-lhe o que poderia fazer para tornar-se percebido. “Fique de pé nesse canto aqui onde a luz é fraca, pois as vibrações etéreas da luz são mais fortes que as vibrações que você pode emitir. Então, organize com firmeza, em sua mente, a mensagem que você quer transmitir e pense nisso com toda a intensidade de que seja capaz. Foi a intensidade de seu pensamento, antes de enfrentar o pelotão de fuzilamento, que chegou a mim em minha casa e me fez deixar por certo tempo meu corpo físico para poder vir a você e lhe dar uma ajuda em sua hora de transição. Se você puder, com intensidade semelhante, pensar na mensagem que deseja transmitir à sua irmã, ela vai recebê-la e seus olhos dirigir-se-ão para você”.

Assim instruído, o espião formulou a seguinte mensagem: “Encontro-me na Terra dos Mortos que Vivem; eu atravessei o véu”. Olhando fixamente para sua irmã, permaneceu ali, imóvel, reiterando a mensagem por alguns minutos. Subitamente, os olhos de sua irmã procuraram o canto onde ele se encontrava e, percebendo ali a presença do irmão, ela começou a tremer e caiu desmaiada no chão. Imediatamente, o espião correu para levantá-la, quando, com um grito de alegria, ela atirou-se em seus braços.

“Ò, você chegou, Bob? Faz poucos dias que eu recebi uma carta dizendo que você fora enviado em perigosa missão, e aqui está você. Como foi que isso aconteceu?”

Uma vez mais, o rosto do espião ficou tomado por pálido espanto. Ele havia visto sua irmã cair, e aqui achava-se ela de pé! Ela também estava morta?

“Não”, explicou o Rosacruz, enquanto dava um passo à frente e se apresentava a ela como um amigo de Bob. “Não, ela não está morta; apenas desmaiou e terá que retornar a seu corpo. Lá está o corpo dela, caído no chão, tal qual  o seu corpo, Bob, após lhe terem desferido o tiro fatal. Provavelmente, ela não terá nenhuma lembrança de ter falado com você, nem ficará sabendo que você está na Terra dos Mortos que Vivem, mas terá apenas a impressão de ter visto o seu fantasma e de que algo se passou com você; quer dizer, a menos que você tenha conseguido impressioná-la o suficiente com sua mensagem quando afirmou que você transpassou o véu e acha-se, no momento, na Terra dos Mortos que Vivem. Todas as noites, porém, quando ela for dormir, você terá a mesma chance de falar-lhe como agora, pois, quando estamos dormindo, vamos para o mesmo lugar daqueles que o mundo chama de `mortos ´.”

Nesse momento, a irmã do espião parecia ter caído no sono e foi irresistivelmente atraída para o corpo que jazia no chão. Gradativamente, o espião viu que ela se desvanecia e desaparecia dentro daquela forma que, em seguida, começou a gemer e a mover-se.

“Vem, vamos embora”, disse o Rosacruz. “Enquanto você falava com ela, eu trabalhei sobre o corpo dela, fazendo tudo o que podia para facilitar o seu retorno ao estado consciente. Não há nada que possamos fazer por ela. Vem, vamos embora daqui.”


 
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